quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Adesivo

 
 Para Luah Kugler, em uma brincadeira com a saudade.


Vivo, flutuo e penso.
Penso enquanto vivo
voo enquanto vento
vivo enquanto morto.

O amor é vento.
Pipa enquanto flutua
flutua enquanto pensa
bóia e não afunda.

Disparo caroço de Vento
que flutua e  não tropeça
não afunda, não perde peça.
Tudo posso quanto amo.



domingo, 25 de novembro de 2012

A dimensão esquecida




Para o amigo e poeta da vida Rubem Leite
 

O triste é que foi tudo impuro como o salto que levita. O salto é imantado a uma lei que desconhecemos.

Eu disse triste? Não. Foi apenas uma mentira que pensava e descarrilou minha língua, chicoteando-a. Esta é a linguagem da vida e eu a ouço. Disso você não entende, por mais que especule. 

Quer saber mesmo o que penso? Sim?  Então vamos lá. Mas, não me venha com assuntos corriqueiramente manjados. Não quero saber da liberdade contingencial e condicionada. Tire a liberdade de tudo que seja exato ou metafísico. Começamos por aqui.  Este é um generoso começo não concorda?

A noite hoje está cheia  como uma grande colmeia. Consegue ouvir?  Já pensou na possibilidade da existência de vida dentro de uma xícara de café? Lembrei-me da amiga de uma tia minha. Previu os dois enfartes do meu tio, a vinda de uma “vida nova” e uma perda na família ( referia-se a minha tia-avó, bem debilitada por sinal) em uma xícara de café. Enfim, a coitada não descobriu é que era com o dinheiro das “consultas espirituais”  que o filho, meu grande amigo, bancava o baseadinho para todo mundo. 

Está bom o café? Desculpe. Você não toma mesmo café?  Pois deveria, não se deve confiar nas pessoas que não tomam café. Deixe que eu tomo o que coloquei para você enquanto vamos lá para fora.
Claro, na calçada mesmo.  Você é mais um que não repara no chão? Pois eu daria tudo para ouvir o que uma calçada tem a dizer.  Bem, não seria uma conversa, não há igualdade com as calçadas e o chão. O que pode haver são segredos. Unicamente segredos. Segredos sóbrios. É isso que nos separa do chão e das calçadas: segredos.

Um segredo nunca foi sinônimo de verdade exclusiva. Isso é papel de editor de revistas de fofoca ou diretor de novelas. Um segredo é anunciação.

Você já pensou sobre o seu segredo?  A entonação foi acidental, não me chame de arrogante. Eu respeito seu direito de não responder, mas, guarde a pergunta. Um segredo também é incubador de respostas.
Acompanhe aquele  casal. O segredo da mulher que segura na mão do homem, e busca sua alma, está longe do prazer. Aliás, amigo, ai daqueles que preconizam o prazer como a sístole-diástole da vida! O prazer da mulher está em ser silêncio e buscar o vazio.  Para ela, o homem é muito mais que um complemento. São as pessoas difíceis que enaltecem as nossas fraquezas  e ela por ser linha e ele agulha, formam o manto. O frio, entretanto, é o que os separa. O frio é consoante, o frio é passageiro. 

Poderia dizer que esta é uma realidade das grandes cidades. Especulo apenas para você, testemunha dos meus devaneios. Para qualquer outra pessoa, um passo além da fronteira dessas palavras seria um desperdício.  O barulho, a discussão...são sempre registros do que deveria ter ficado no silêncio. Aproveito para considerar que  o barulho tem a mesma propulsão do chicote que esfola e instiga a língua. O único veneno que paira no ar é a suspeita. Triste realidade não?

Eu agitado? Deve ter sido o café.  Nossa, acabei falando demais! São cinco horas da manhã!  Você quer mesmo ir? 

Vá pela calçada mais longa, esta que segue a Avenida até o final.  Depois, siga pelos seus devaneios fieis e encontre o amanhecer do dia com olhar raro, o olhar que não faz do dia “mais um”.  
 Não ria, é serio!  A loucura só é tormenta para quem não cabe nela ou faz dela um vício. 

Vou terminar de ler meu livro de Contos Espanhóis. 

Eu ficarei bem, obrigado.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O que salta é libertação



Não negocio minha sorte.
Daquilo em que cala a partida
nasce o horizonte ao norte.
Pés descalços em investida!


Eu  vejo um lírio
que é paz e reina
para a solidão que não é martírio
o corpo é leve como pena.


Encontro luz na chama branda (sábio?)
O limite da terra é o contorno dos lábios
para quem matou seu amor material.


Fiz na Terra o pó de encanto
o recomeço é luz que seca o pranto
Divino. Mais que divino...real!




Sonetinho escrito durante a aula de estatística! Ta aí o porquê de não entender a matéria! 

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Entre café e palavras: reunião.



Era uma manhã escorregadia. 

O dia começou atrasado e seguindo os ponteiros da manhã eu também permaneci alguns minutos a mais  na cama. Nada justificava aquele momento de atraso. Entretanto, o atraso justificou-se por si mesmo.  Todo atraso com boa intenção é nobre. Para os preguiçosos, o frio e a cama são dois opostos complementares.

Mal cheguei ao trabalho, ainda com o bom dia a ser dito sonoramente  aos colegas e já avistava a mesa do chefe com uma preocupação ofegante. As reuniões são ótimos lugares para perpetuar os problemas e lá estava eu para oferecer minha contribuição...

Enquanto o chefe não chegava, me aproximei dos colegas da repartição e ainda cansado, com a alma pregada à cama, iniciei a conversa: 

-  São mil passos lentos que essa gestão tem dado para lugar algum! As decisões já foram tomadas meus caros, não haverá solução e sim conflito... As melhores condições de trabalho que tornaram-se os slogans das campanhas tinham data de validade e estas já expiraram, ao fim do processo eleitoral! Vejam a mesa não está mais carnuda hoje? Há salames e rocamboles para vocês! Chá de canela e doces para brindar a apatia motivacional dos nossos chefes!  Essa Prefeitura é um sarro! Querem equacionar a disparidade de melhores formas de trabalho cavando mais e mais os buracos entre nós e eles. Implodindo as rochas desses buracos é para lá que vamos. Somos invisíveis e só servimos para tapar os buracos. 

Após o desabafo, a atmosfera transfigurou-se. Um semblante meditativo pairava sobre nós. 

Senti que tinha descarregado emoções aleatórias no ar. Senti que fui desleal com os colegas. Verdade é que  os representantes do  funcionalismo público em São Bernardo do Campo tem agido com indiferença e distância. Não há propostas, não há diálogo. Há uma vertiginosa voz que materializa-se para informar, redigir e publicar. Nunca para consolidar um convite amigável  ou estender os braços. Há apenas a distância e nós, os funcionários públicos, como números de semblante vazio. 

Ainda sentia  os vapores de uma angústia desconhecida em meu peito. Fui com os colegas para o café, e era apenas isso que queria. Já tinham avançado e caído na mais antiga técnica de domesticação do ser humano: o estômago.

Enquanto saboreava o café, este Rei das Manhãs, alguns colegas se aproximaram. Começamos a falar sobre filmes.  Na Seção tenho todos os funcionários como exemplos! São pessoas de todo o bem e com a humildade que sorri à face. Ali, todas as pessoas unem inteligência à dignidade.

Lembrei que na noite anterior havia assistido ao filme que gerou a discussão: Melancolia. 

O desconforto à precarização da  condição humana e principalmente a angústia de sua finitude, eram discutidos ali em meio aos glutões devorando o apetite para incrementar a argumentação para a reunião. Surgiu-me então um nome que não tinha conhecimento. Tratava-se  de um filósofo dinamarquês que escreveu lúcidos textos sobre a Angústia e eu  precisava de um papel para anotar o nome e pesquisar sobre ele depois. 
Ao tirar o papel do bolso, uma surpresa: 

Melancolia

Meia noite em minha casa
voltando de mais uma aula vazia
(e bem depois daquela briga)
vai dois dedos de conhaque
e na tv melancolia."

Lembrei que havia adormecido durante o filme. As letras no papel eram minhas! Mas, não lembrava de ter escrito nada durante o filme...

Intrigado, não havia mais tempo para pensar. O chefe estava ali e a reunião iria começar...

Decidi, entretanto colocar algumas folhas de papel no bolso e uma caneta também. Mais do que isso, a missão era me manter atento a qualquer distração e sonolência.

É sempre bom estar preparado para quando o poema aparecer! 







Este texto é ficcional e surgiu após o presente do poema “Melancolia" do grande amigo Flavinho! ( O Agente de Biblioteca Flávio Cilento) 
Ofereço como um agradecimento aos amigos da Seção de Biblioteca Escolar e nossas contínuas lutas  para o implemento de políticas mais humanas e participativas aos Funcionários Públicos de São Bernardo do Campo.

É uma Seção enorme, de pessoas maravilhosas, mas, gostaria de citar alguns nomes em que gostaria de endereçar meu sentimento eterno de gratidão:

Ao grande amigo e filósofo ( O nosso " Google" ) Marcelo Blum; Ao "meninão" e futuro jornalista Cleber Benedetti; Para as bibliotecárias Sílvia ( Mimi Curica) e Elizângela;  Ao estimado Professor-Amigo-Filósofo Andrei Vaczi; Ao poeta-advogado Flávio Cilento ( autor do poema Melancolia); Ao " Bill Gates" da Seção e Professeur du Français Rafa Saad; para a Aline Lima , atual chefe da SE. 132, cuja boa vontade e persistência no bem devem ser enaltecidos e aos grandes amigos que já passaram por nós e hoje estão em outra caminhada, em especial, ao nosso mais recente Papai-Professor de Português Serjão!! 




terça-feira, 13 de novembro de 2012

Até aqui


Que graça a rua que passa!
No Paço eu
ao passo de casa
que desgraça!

Leve-me rua que passa!
A tristeza é um breu
invisível aos olhos de quem me abraça.
A inspiração é superfície e segredo Seu.


Consolo é crer na rua que passa!
O milagre é calma 

quando a dúvida de vidro estilhaça!
A rua mostrou, porque é rua que passa.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

O toque da Avenida


Certa vez
encontrei uma interrogação
correndo entre o passado e o futuro.

De gravatas e sapatos largos
ou cachecol e batons claros
 o passo vasto
era  refratário de insatisfações.

Ali
naquele instante
( para os que creem)
nascia a poesia dos homens que correm.

Eu assistia de tudo sorrindo
não desprezando
porque me renovava .
Também fazia parte desta Gênese.

A realidade é invisível.
Tudo que você vê é um instante que passa
 e as carcaças exiladas são rústicas como bolas de sabão
que sobem
e viram nuvens
ou homens...